Essa é a história da minha vida e da minha trajetória empreendedora. Também é a história não contada sobre como criamos a maior plataforma de print on demand da América Latina sem saber nada do mercado, ter família rica ou levantado milhões de reais.
Fui influenciado pelo Eduardo Belotti e estou escrevendo essa história em partes, postando um capítulo por semana dessa aventura. Esse é o capítulo 4 de 19 - encontre os demais capítulos aqui.
A essa altura eu estava muito feliz trabalhando na Vandal fazendo as partes bem pouco glamourosas do negócio. Mas o lado acadêmico da minha vida estava de mal a pior. Depois desses anos na empresa junior e tendo alguma experiência empreendendo, ficou claro para mim que eu não queria ser engenheiro eletricista – sim, esse é o termo correto para se referir a quem se forma em Engenharia Elétrica.
Eu estava decidido que queria ser um empreendedor e que jamais ficaria calculando linhas de tensão como funcionário de outras empresas, muito menos prestaria concurso ou trabalharia no setor público. Consultoria e mercado financeiro também já tinham perdido o apelo.
A partir do terceiro período eu comecei a frequentar a faculdade só para continuar sendo membro da Fluxo. No período seguinte eu reprovei minha primeira matéria: Física Experimental. O que me fez ter certeza de que eu precisava largar a faculdade foi eu ter reprovado por falta. E o pior: eu passava a maior parte do meu dia no Fundão, só que na sala da Empresa Junior trabalhando como voluntário!
Poucas semanas depois de começar a trabalhar, eu tranquei minha matrícula na faculdade. Foi uma das decisões mais difíceis que já tinha tomado na vida. Até porque eu ganhava uma bolsa da Petrobras para estudar, e a bolsa era maior que meu salário. Largar a faculdade obviamente implicava em abrir mão dessa bolsa.
Eu estava decidido que iria me dedicar a empreender e num futuro próximo buscaria outra graduação mais alinhada com meus objetivos – acabei me formando alguns anos depois em administração na PUC, o que foi ótimo. Eu tinha convicção de que essa decisão, que parecia a coisa mais importante do mundo naquele momento, num horizonte maior de tempo faria muito sentido.
Voltando aos negócios, essa época dos primórdios da Vandal foi muito divertida. Éramos basicamente Arturo, Ricardo e eu em uma salinha de servidores no canto do escritório da Elo Group, no Centro do Rio de Janeiro, ouvindo playlists de punk rock no 8tracks e tocando o negócio. Nessa mesma sala ficava toda a operação e nossas duas estações de trabalho. Sim, a gente se revezava entre quem estava operando a impressora de camisetas e quem trabalhava no resto usando os computadores.
No começo eu ficava a maior parte do tempo imprimindo camisetas, embalando pedidos e levando-os até os Correios. Conforme nós íamos ficando mais sagazes, a produção ia ficando mais rápida. Assim eu comecei a pedir mais responsabilidades e ver mais áreas do negócio. Em pouco tempo estava cuidando também da emissão das notas fiscais, do controle dos códigos de rastreio, das redes sociais e por fim até do atendimento.
As primeiras versões do site da Vandal eram bem pouco automatizadas. Para que um nova usuário criasse seu perfil e pudesse enviar suas estampas, ele precisava entrar em contato conosco por e-mail e nos enviar os arquivos por anexo. Com os arquivos, um de nós ajustava manualmente como ficaria a camiseta em um mockup no Photoshop e cadastrava manualmente aquele produto na plataforma de e-commerce do site dentro da página daquele usuário.
Como a primeira versão tinha sido feita por um programador da Innvent em seu tempo vago, o site ficou dessa mesma forma por um bom tempo.
Até que dois amigos de Arturo de sua turma da Engenharia de Produção voltaram do intercâmbio decididos a trabalhar com tecnologia: Flavio Wuensche e Rodrigo Gomes, também conhecidos como Flavinho e Digão.
Os dois tinham passado um tempo na França e tomaram gosto por programar lá. Quando voltaram ao Brasil, queriam programar mais e em projetos reais. Logo foram trabalhar na Elo e convenceram todo mundo que faria sentido trabalharem em alguma das startups da Innvent. O detalhe é que os dois, apesar de serem das pessoas mais inteligentes que já conheci, mal sabiam programar! Arturo tinha certeza de que eles seriam capazes de aprender o que fosse necessário e ter alguém que soubesse programar e entendesse de negócios seria difícil de encontrar.
Nessa época, Ruby on Rails, o framework de desenvolvimento criado pela 37signals, estava em alta e algumas pessoas do time de tecnologia da Innvent ajudaram os meninos a aprenderem o básico para que pudessem trabalhar na Vandal. Em muito pouco tempo Flavinho e Digão foram criando casca e confiança para se meter no projeto e começaram a desenvolver soluções para o produto.
Uma das mudanças mais significativas foi quando uma nova versão do site foi pro ar onde os usuários podiam enviar suas estampas por conta própria, sem precisar entrar em contato conosco. Pra gente isso foi bom, porque poupava muito trabalho, mas para os usuários foi game changer.
O ritmo com que novos produtos eram cadastrados no site aumentou significativamente. A partir disso conseguimos ver nosso flywheel de crescimento em ação. Mais pessoas cadastrando produtos significava, mais variedade de estampas para serem compradas, o que significava mais gente satisfeita ao buscar alguma coisa no site. Fora que quando alguém cadastrava um produto geralmente enviava esse link para mais pessoas, o que aumentava também o tráfego.
Nós éramos experts em fazer muito com muito pouco. Não investimos um centavo em tráfego pago e crescemos muito baseado no boca a boca ou em táticas de guerrilha.
Me lembro da primeira vez que investimos em um post patrocinado, em um blog chamado Hypeness. Para nós foi uma decisão dificílima pagar quase R$2.000,00 em um post. Afinal, as contas eram apertadas e o dinheiro contado. O resultado foi assustador e vendemos 300 camisetas em um dia por conta da divulgação – isso era muito mais do que um mês normal nosso.
Outra estratégia foi começar a participar de feiras no Rio de Janeiro, como a Babilônia Feira Hype. Nessas feiras, nós levavamos a impressora de camiseta para as pessoas poderem escolher sua estampa em um catálogo e verem sua peça sendo impressa ao vivo em menos de 2 minutos. Era um sucesso absoluto, todo mundo amava essa experiência!
O resultado nas vendas de todas essas iniciativas foi surreal. No ano que eu entrei, vendemos 28 camisetas no mês de Janeiro. Foram meses e meses de melhorias contínuas no produto, novas campanhas e muitas feiras até Dezembro, quando vendemos cerca de 1.600 pedidos. Nossa meta super ousada era vender 1.000 camisetas, mas batemos esse número impressionante em tempo recorde graças ao esforço de todo o time.
Começamos a ter validações externas também. Aparições na mídia e parcerias com marcas que admirávamos começaram a rolar. Dois momentos icônicos foram quando saímos no jornal pela primeira vez e a parceria que fizemos com a Farm, marca de moda carioca que hoje é um fenômeno global.
Na parceria com a Farm, levamos a impressora de camisetas para dentro das lojas deles e imprimimos fotos dos Instagram das clientes em peças da marca. Fizemos uma landing page que baixava as fotos postadas com uma Hashtag específica e as transformávamos em estampas estilizadas ali na hora. Fez tanto sucesso que a Farm nos levou lojas deles em mais 3 estados!
Tudo estava indo maravilhosamente bem e pouco tempo depois batemos o marco histórico do primeiro milhão de reais vendidos no ano. Até que começamos a ter problemas que não esperávamos…
Flavinho e Digão tinham topado entrar para o time na ideia de se tornarem sócios do negócio e ganharem participação caso sua contribuição fosse significativa. Para mim, era óbvio que tinha sido. Eu tinha essa mesma expectativa e, apesar de não ter formalizado nada, queria me tornar sócio em algum momento. O que eu descobri depois era que o acordo entre eles também não estava formalizado!
Parece que na hora de distribuir o equity houve um grande desentendimento dos valores e um estresse se formou entre os sócios da Vandal. Esse clima estranho pairou por alguns meses até que Flavinho e Digão perceberam que não fazia sentido continuar ganhando pouco e sem a chance de ganharem equity. Ainda mais depois de tudo que já tínhamos construído juntos.
O clima ficou uma merda e a frustração deles se tornou a frustração minha e do Arturo. Tentamos segurá-los no time, mas a cagada já estava feita e os dois decidiram voltar para o mercado.
Internamente estávamos destruídos, e o Ricardo manteve uma postura de que não fazia sentido distribuir a participação, mesmo isso já tendo sido conversado meses antes.
Esse desentendimento gerou uma briga tão grande que a sociedade não aguentou. Arturo buscou diversas formas de dissolver a sociedade com Ricardo, mas o contrato social foi feito de uma forma que não previa esse tipo de resolução de conflito.
Essa foi uma das épocas mais tristes no trabalho para mim. Batalhamos muito para construir um negócio que desse certo e finalmente conseguimos o que parecia impossível. E de uma hora pra outra a sensação era de que tinha sido tudo em vão.
Arturo e eu seguíamos indo diariamente ao escritório para fazer com que o negócio continuasse de pé. Entendiamos que as várias pessoas vendendo conosco e nossos clientes dependiam de nós. Enquanto isso, Ricardo ficava brigando para resolver o impasse societário.
Foram cerca de 7 meses nessa situação terrível, onde fazíamos muitas conversas com advogados, mentores e amigos para saber o que fazer.
Por volta dessa época apresentei Pedrinho Salomão, fundador da Radio Ibiza, para o Arturo. Certo dia marcamos um café com o Pedrinho em seu escritório para pedir conselhos. Nós nem chegamos a citar o assunto de antemão, mas entramos na sala dele com a moral tão abalada que ele não nos deixou nem falar e lançou:
— Hmmmm, deu merda, né? Briga entre os sócios? Puta que pariu…
Ele sempre foi um dos caras mais humanos e sagazes socialmente que eu já vi, mas essa leitura foi inesquecível.
Contamos tudo pro Pedrinho que nos deu um conselho poderosíssimo:
— Foda-se, larguem tudo e façam de novo. Vocês sabem que são bons e que fazem esse negócio acontecer. Já fizeram uma vez e vão fazer de novo.
Acho que no fundo no fundo, a gente já sabia e acreditava nisso. Mas ouvir alguém falando na sua cara é diferente. A partir dali ficamos mais certos de que seríamos capazes de fazer esse negócio de novo e mudamos nossa postura em relação ao conflito.
Mas como isso termina é história para o próximo capítulo…